quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

Protestantismo Tupiniquim

Gedeon Alemcar
Capítulo VI (stou postando apenas um trecho deste capítulo)
Neopentecostalismo e sua Adequação Cultural


"Dia 8 de abril de 2001, domingo pela manhã, no Rio de Janeiro, 38 graus, fui ao culto na Catedral Mundial da Fé. Um grandioso prédio com ar condicionado, som ideal, berçário funcionando, estacionamento em perfeito uso, orientadores em todas as portas dando informações e facilitando lugares. A platéia, masculina e feminina, de bermuda, chinelo de dedos, camiseta cavada, dançando e recebendo a benção – um ambiente confortável e libertário. Na mesma manhã, peguei um táxi correndo e fui à Assembléia de Deus, sede do Ministério de São Cristóvão – era a Santa Ceia Geral onde todas as igrejas e ongregações do Ministério estavam reunidas. Casa lotada, todos os homens-obreiros de paletó e gravata, calor insuportável, e um desfile de avisos, cânticos de conjuntos, duetos, coral de senhoras, e palavras dos pastores – um ambiente austero e conservador. Poderia exemplificar também com as liturgias das igrejas tradicionais: enfadonhas, repetitivas e completamente distantes da informalidade brasileira. Neste país de “rito frouxo”, como bem sintetiza Holanda (1999:151), e com “aversão ao ritualismo”, toda nossa pretensão de liturgia é simulacro anglo-saxônico. Resultado: nem somos autênticos protestantes latinos, nem austeros britânicos reverentes.
Para um visitante de primeira viagem, qual reunião ele vai achar mais “confortável”, na hipótese de um retorno?
Nesse aspecto, o neopentecostalismo é expressão mais aculturada que já tivemos neste país. A Igreja Universal é paradigma da cultura do self-service religioso, do que Prandi chama de “religião paga” e prestação de serviço religioso (1995). E se ela e suas congêneres não chegam à “glorificação da cintura para baixo” (DaMatta), servem como legitimação. Como explicou o Pr. Wesley Bandeira, da Comunidade Sara a Nossa Terra:

As pessoas têm idéia de que ser evangélico é fazer muitos sacrifícios. Não há sacrifícios, é liberdade total. (...) A maior parte das igrejas prega, primeiro, a mudança de comportamento, depois promete o amor de Deus. Aqui, é o contrário, Deus está em primeiro lugar e recebe todo mundo. Até porque Jesus vivia rodeado de ladrões e prostitutas 101.

Sabonetes, perfumes, óleos, músicas, são todos vendidos como qualquer outro produto. Então, o culto, a oração, a benção, idem. A questão é que se o cliente/fiel não ficar plenamente satisfeito com o “produto”, não poderá se dizer ludibriado por “propaganda enganosa” e reclamar no Procon, Delegacia do Consumidor ou Conar. Então a criação de um “Procon Espiritual”, como sugeriu o historiador Ziel Machado, numa palestra no ICEC, seria uma boa providência.
Esta seria, então, a razão porque vips, ricos, famosos e emergentes estão aderindo? Já ouvi em um debate, alguém dizer que isto é marketing de artista em final de carreira para voltar à mídia com um “público de cabresto”. Aderir à “indústria do testemunho” é a forma mais simples (?) de encher as burras de dinheiro. Penso que, isto é um julgamento muito grave que eu não me atrevo a fazer. Mas não podemos escapar do conceito de “religião como espetáculo”. Tudo hoje é midiático e a vida é uma realidade imagética. Um reality show com diversas cenas. Portanto – Deus me perdoe a blasfêmia –, o culto, o testemunho são apenas algumas das cenas. O corpo, sadio e feliz, é fundamental para implementação do show. Perdão, do culto.
E como esta adequação da teologia do corpo não tem limites, há na praça um CD gospel chamado de “Bonde do Ungidão” uma paródia do Bonde do Tigrão. A música é igual, muda apenas a letra. Como ouvi apenas o CD, fiquei curioso para saber como as “popozudas” e os “tigrões”, devem fazer a coreografia “ungida”."

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